Tratamento de partículas finas de concreto com CO2: a rota de mineralização que viabiliza o uso de materiais cimentícios de baixo carbono

Processo converte resíduos em insumos de alto valor agregado, reduz emissões e apresenta soluções reais para a descarbonização da construção civil

A descarbonização da cadeia produtiva do cimento e do concreto configura-se como um dos maiores desafios da construção civil. Nesse cenário, pesquisas associam eficiência técnica, circularidade e captura permanente de carbono, vêm ganhando destaque. Entre elas, destaca-se o estudo desenvolvido por Kathleen Dall Bello de Souza Risson, engenheira e pesquisadora no Instituto Federal do Paraná (IFPR) campus Foz do Iguaçu, que investigou o tratamento de partículas finas de concreto com dióxido de carbono (CO₂), por meio de uma rota conhecida como mineralização ou carbonatação acelerada.

“Busquei entender como partículas muito finas, menores que 0,15 mm, provenientes da reciclagem de Resíduos da Construção e Demolição (RCD), poderiam capturar CO2 e, ao mesmo tempo, gerar materiais aptos a substituir parte do cimento”, explica Kathleen.

O trabalho analisou pós obtidos por moagem de corpos de prova de concreto e de RCD misto (resíduos cerâmicos e cimentícios), observando comportamento, desempenho e capacidade de fixação de CO2 em cada tipo de material.

Tratamento na câmara de CO2
Crédito: Acervo Pessoal

Como funciona a mineralização com CO2

O processo de carbonatação mineral consiste em um mecanismo físico-químico que transforma CO2 em carbonatos estáveis, a partir de sua reação com minerais contendo cálcio e magnésio.

Na pesquisa, essa técnica foi aplicada em uma câmara de carbonatação do tipo gás–sólido, no qual pós previamente umidificados foram submetidos a condições controladas de temperatura, concentração de CO2 e umidade. “Em condições otimizadas, o pó de concreto conseguiu capturar entre 10 e 13 kg de CO2 por tonelada em apenas 30 minutos, chegando a quase 30 kg por tonelada após 24 horas”, relata a pesquisadora.

Após o tratamento, os materiais foram secos e utilizados como materiais cimentícios suplementares (MCS). Os resultados mostraram-se expressivos: o pó mineralizado apresentou potencial para substituir até 25% do cimento convencional, mantendo níveis de resistência mecânica equivalentes aos de um cimento classe C32 aos 28 dias.

Sustentabilidade comprovada por indicadores ambientais

A rota estudada por Kathleen não apenas melhora a qualidade das partículas finas, como também reduz a pegada de carbono da construção civil. Para mensurar esse ganho ambiental, foi utilizado o Índice de Carbono (CI), obtido pela divisão entre o total das emissões de CO2, em (kg.CO2) gerado pela produção e transporte de todos os materiais usados na produção de 1 m³ de argamassa, e a resistência à compressão da argamassa obtida aos 28 dias. Ou seja: (IC kg.CO2/m³/MPa).

Corpos de prova de concreto que geraram os pós de concreto
Crédito: Acervo Pessoal

Segundo a pesquisadora, “os pós carbonatados apresentaram um CI de 10,59 kg.CO2/m³/MPa, uma redução de 7% em relação ao pó não tratado e valor inferior ao observado para o cimento comercial CP II-F 32”. Esse resultado evidencia uma solução tecnicamente viável e ambientalmente competitiva, capaz de assegurar desempenho mecânico equivalente, reduzir a intensidade das emissões de carbono e promover o reaproveitamento de resíduos anteriormente tratados como passivos ambientais.

Impactos diretos e indiretos para a construção civil

A aplicação dessa tecnologia está alinhada aos principais roadmaps de descarbonização do setor, os quais convergem para estratégias integradas que combinam captura de carbono, redução do fator clínquer e substituição de matérias-primas convencionais. “Transformar resíduos em recursos, fixar CO2 de forma permanente e gerar um material com potencial real de mercado é um salto tecnológico significativo”, afirma Kathleen.

Além de aprimorar o desempenho ambiental das empresas, a mineralização cria oportunidades para o desenvolvimento de modelos de negócios baseados na economia circular, ao mesmo tempo em que pode contribuir para políticas públicas voltadas à circularidade e à inserção do setor da construção no mercado de carbono no Brasil.

No âmbito das aplicações práticas, o pó mineralizado apresenta potencial de utilização em produtos cimentícios sem função estrutural, tais como pavimento intertravado de concreto, revestimentos, bancos, guias e mobiliário urbano. “Para viabilizar a expansão industrial, será necessário integrar recicladoras, concreteiras e fabricantes de artefatos em novos arranjos produtivos”, destaca a pesquisadora.

Uma rota promissora para o futuro

Pesquisadora Kathleen Dall Bello de Souza Risson
Crédito: Acervo Pessoal

O estudo desenvolvido no Instituto Federal do Paraná (IFPR) e na Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA) demonstra que amineralização de CO2 em partículas finas de concreto é tecnicamente viável, ambientalmente vantajosa e estrategicamente alinhada às necessidades de um setor que busca soluções eficazes e de rápida implementação para mitigar emissões. “Já avançamos também em pesquisas com outros resíduos e agregados. Ampliar essa tecnologia é fundamental para fortalecer soluções sustentáveis dentro da cadeia do concreto”, afirma Kathleen.

Cada avanço nessa área contribui para aproximar o setor da construção civil de um modelo produtivo de menor intensidade de emissão, mais circular e tecnicamente mais eficiente, consolidando um percurso no qual inovação tecnológica e sustentabilidade ambiental se integram de forma indissociável.

Entrevistada

Kathleen Dall Bello de Souza Risson é graduada em Engenharia Civil pela Faculdade Dinâmica das Cataratas (UDC), especialista em Gerenciamento e Execução de Obras (UDC) e em Docência da Educação Profissional e Tecnológica (IFPR), mestre em Engenharia de Edificações e Saneamento pela Universidade Estadual de Londrina (UEL) e doutora em Energia e Sustentabilidade pela Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA). Atua como docente EBTT e pesquisadora no Instituto Federal do Paraná (IFPR), campus Foz do Iguaçu. Desenvolve pesquisas nas áreas de obtenção, processamento, caracterização e tratamento de resíduos para uso como material cimentício suplementar; mineralização de CO2 em resíduos sólidos como tecnologia para mitigação das emissões de carbono; e dosagem e performance de pavimentos em concreto permeável.

Contato
kathleen.souza@ifpr.edu.br

Jornalista responsável
Ana Carvalho
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