Quem constrói alto padrão constrói habitação popular?
São nos empreendimentos de interesse social que a engenharia costuma usar primeiro os sistemas inovadores
No painel “Indicadores Estratégicos de Produtividade”, realizado dentro da edição virtual do 92º ENIC (Encontro Nacional da Indústria da Construção), os engenheiros civis Roberto de Souza, diretor-presidente do CTE (Centro de Tecnologia de Edificações), e Ubiraci Espinelli Lemes de Souza, professor da Escola Politécnica da USP (Poli-USP), abordaram a questão da produtividade na construção civil. No centro do debate, trouxeram à tona as diferenças da engenharia que constrói empreendimentos de alto padrão e a engenharia que constrói habitação de interesse social.
Segundo eles, cada uma tem as suas especificidades. No que se refere à engenharia para moradias populares a complexidade é maior, por causa do orçamento apertado e dos protocolos exigidos por quem financia – no caso, o poder público. Por isso, entendem os debatedores, abre-se um amplo campo para que sistemas construtivos industrializados e novas tecnologias sejam explorados primeiramente nos projetos de habitação de interesse social, os quais trabalham com escalas maiores de produção, para depois migrarem para o alto padrão. Isso já foi visto no Minha Casa Minha Vida (MCMV).
O programa recentemente substituído pelo Casa Verde e Amarela chegou a 65% de seus projetos utilizando a tecnologia de paredes de concreto. A eficácia do sistema construtivo migrou para quem constrói casas e edifícios de alto padrão com mais de 20 pavimentos. Para Roberto de Souza, esse é um bom sinal. “As empresas (construtoras e incorporadoras) estavam em uma zona de conforto. Mas algo está mudando, até por conta de novos consumidores que chegam ao mercado e de novos comportamentos. Isso está desafiando as empresas a mudarem e a pensarem em inovações”, avalia.
Produtividade da construção civil no Brasil é um problema macroeconômico
Para o diretor-presidente do CTE, no centro do debate está o aumento da produtividade. Neste ponto, a intervenção do professor Ubiraci Espinelli trouxe dados interessantes mostrados no painel. Primeiro, o professor da Poli-USP entende que produtividade no Brasil é um problema macroeconômico. Ele avalia que deveria haver um pacto da construção civil brasileira, a fim de que o setor conseguisse fazer a produtividade crescer de 3% a 4% ano, ao longo de uma década. Se isso ocorresse, seria possível atingir patamares perto do que hoje já é realidade em países como Estados Unidos, Canadá e Alemanha, por exemplo.
Para ilustrar a defasagem nacional no quesito produtividade em canteiros de obras, Spinelli apresentou números que são frutos de uma pesquisa realizada em parceria entre USP e SindusCon-SP. Foram coletados dados de 16 das 20 principais construtoras do estado São Paulo. O resultado a que se chegou é o seguinte: entre as empresas que fizeram parte da pesquisa, 1 pedreiro gasta, em média, 1 hora para erguer 1 m2 de parede de alvenaria. Quando se trata de estrutura de concreto armado, o levantamento apurou que, entre montagem das fôrmas, colocação das ferragens e concretagem, o tempo varia de 6 horas a 19 horas (média, 9 horas) por m3.
Comparativamente, segundo estudo do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV IBRE), os trabalhadores da construção civil de países europeus, da América do Norte e da Ásia são, em média, 40% mais produtivos que os do Brasil. Ou seja, no exterior 1 m2 de alvenaria pode ser erguido em 36 minutos e 1 m3 de concreto finalizado em 5 horas e 24 minutos. “Obviamente, essa diferença no tempo de produtividade pode mudar para mais ou para menos, pois depende de um conjunto que envolve projeto, sistema construtivo, processo de produção e organização do trabalho. Mas o que se constata é que a construção civil brasileira tem como melhorar esses números”, finaliza o professor da USP.
Entrevistado
Reportagem com base nas informações passadas dentro do painel “Indicadores Estratégicos de Produtividade”, realizado na edição virtual do 92º ENIC
Contato: comunica@cbic.org.br
Jornalista responsável: Altair Santos MTB 2330
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