Urbanismo verde pode ser um aliado ao combate às enchentes

Sistemas que incorporam macro e micro drenagem com infraestrutura verde têm o potencial de maior eficácia
18 de janeiro de 2024

Urbanismo verde pode ser um aliado ao combate às enchentes

Urbanismo verde pode ser um aliado ao combate às enchentes 1024 618 Cimento Itambé
Parque Barigui, em Curitiba (PR), foi projetado para receber o excesso de água do rio e evitar o fluxo para as áreas residenciais.
Crédito: Prefeitura de Curitiba

Ultimamente, com as mudanças climáticas, várias cidades no Brasil vêm sofrendo com os efeitos causados pelas chuvas e enchentes. No último final de semana, um temporal atingiu o Rio de Janeiro e deixou 12 mortos. De acordo com Felipe Guerra e Débora Ciociola, arquitetos do Jaime Lerner Arquitetos Associados (JLAA), para além dos piscinões, reservatórios que captam o excesso de água das chuvas nos bairros, existem soluções urbanísticas multifuncionais e integradas ao meio ambiente que as cidades podem adotar para evitar os alagamentos. 

Para Guerra e Débora, as soluções para lidar com o escoamento de chuva incluem a implementação de sistemas integrados de drenagem, como jardins, áreas permeáveis para a absorção de água da chuva, parques e lagoas artificiais. Essas estratégias não apenas abordam a questão do escoamento pluvial, mas também desempenham um papel significativo ao oferecer espaços de lazer valiosos para a comunidade.

Os arquitetos citam o exemplo do Parque Barigui, em Curitiba (PR). Segundo Débora e Guerra, ele foi projetado para receber o excesso de água do rio de mesmo nome e evitar o fluxo para as áreas residenciais. Por isso, alguns dias depois da enchente que ocorreu em outubro de 2023, o local estava praticamente “recuperado” e voltando a receber pessoas.

Outros parques de Curitiba também foram projetados em áreas estratégicas para receber o excedente de água das chuvas. No Bairro Novo do Caximba, por exemplo, está prevista a construção de um parque linear, como forma de absorção para as grandes chuvas. Guerra e Débora apontam que a solução curitibana está dentro do conceito de “cidade-esponja”, que consiste no uso de equipamentos verdes, como jardins e canteiros que cumprem a função de micro drenagem da água, e parques com lagoas para formar o ecossistema de macrodrenagem, que atuam como canalizadores da água excedente da chuva.

Como funciona este sistema que une macro e micro drenagem?

A incorporação de elementos de infraestrutura verde promove práticas que visam à sustentabilidade da gestão da água de forma conjunta com a manutenção de áreas urbanas vegetadas, o que contribui com o microclima e com a qualidade ambiental urbana em sua totalidade, segundo Débora. 

“A macrodrenagem envolve o gerenciamento de grandes volumes de água pluvial em áreas extensas, o que inclui a criação de bacias de detenção – geralmente associadas a parques urbanos – e outras estruturas planejadas para controlar o fluxo da água em momentos de altos índices pluviométricos. Já a micro drenagem tem foco em superfícies menores como ruas, calçadas, praças e terrenos particulares em que técnicas diversas são aplicadas, como pavimentação permeável e diversos dispositivos de retenção para gerenciar a água em uma escala mais localizada”, afirma Débora. 

Débora relata que esse sistema é inovador ao lidar com os desafios relacionados ao gerenciamento de águas pluviais em áreas urbanas de forma sistêmica. 

“Essa abordagem busca gerenciar não apenas as águas pluviais, mas também melhorar a qualidade ambiental urbana e criar cidades mais resilientes. Ela requer uma abordagem colaborativa entre governos, comunidades e setor privado, além de um planejamento urbano que priorize a sustentabilidade com a incorporação de diretrizes de zoneamento que incentivem práticas sustentáveis e o desenvolvimento de infraestrutura verde nas áreas urbanas”, opina Débora. 

Vantagens x desafios

Débora destaca que os sistemas que incorporam macro e micro drenagem com infraestrutura verde têm o potencial de maior eficácia, pois permitem a infiltração da água no solo, reduzindo o escoamento superficial. 

“A infraestrutura verde também ajuda a filtrar poluentes da água pluvial, melhorando a qualidade da água que chega aos corpos d’água. Ainda, abordagens verdes tendem a ser mais adaptáveis às mudanças climáticas, pois podem lidar melhor com eventos climáticos como chuvas intensas, enquanto métodos tradicionais podem ser mais vulneráveis, com maior propensão a inundações e danos”, justifica a arquiteta.

Débora também aponta que o custo inicial das infraestruturas verdes ou “soluções baseadas na natureza” pode ser mais alto devido à necessidade de implementação do sistema que inclui pavimentos permeáveis, canteiros de infiltração, arborização, praças e parques, lagoas e sistemas de retenção de água. Por outro lado, os métodos convencionais podem ter custos iniciais mais baixos, uma vez que são amplamente utilizados; porém, no longo prazo a infraestrutura verde tende a ter custos operacionais mais baixos já que muitos dos seus elementos exigem menos manutenção.

Manutenção das áreas verdes

São diversos os desafios relacionados à manutenção de áreas verdes urbanas e sistemas de macro e micro drenagem, uma vez que demandam uma abordagem integrada que envolva a colaboração entre governos locais, comunidades, setor privado e especialistas em meio ambiente, de acordo com Débora. 

“A educação ambiental e o engajamento comunitário são cruciais para promover a conscientização e a sustentabilidade no longo prazo. A aplicação de políticas públicas ambientais e a integração de soluções inovadoras podem contribuir para enfrentar esses desafios de maneira mais eficaz. Alguns destes desafios são a poluição do solo por contaminação química por meio da exposição a poluentes atmosféricos e resíduos urbanos, o acúmulo de resíduos sólidos com sua deposição inadequada e a pressão urbana com o crescimento rápido e desordenado das cidades que pode ameaçar áreas verdes. Além disso, as alterações climáticas podem potencializar inundações devido a eventos extremos como chuvas intensas, sobrecarregando os sistemas de drenagem. Com relação à manutenção técnica, os custos financeiros e a integração de tecnologias avançadas para monitoramento em tempo real e gerenciamento são também desafios relevantes e precisam ser considerados para o sucesso das infraestruturas verdes e sistemas integrados de drenagem”, recomenda a arquiteta.

Como adaptar a diferentes cidades e biomas?

Débora destaca que várias cidades pelo mundo têm utilizado esta forma de planejar as cidades, principalmente na China e na Europa. “No Brasil, algumas cidades estão desenvolvendo ou já possuem planos para mitigar os efeitos das mudanças climáticas, mas é preciso implementá-los agora”, salienta.

Embora os conceitos da infraestrutura verde sejam os mesmos, cada região, cidade ou área urbana possui um contexto específico. “Uma cidade plana que se insere num bioma mais árido com baixo índice pluviométrico certamente demandará soluções divergentes daquelas elaboradas para uma cidade com topografia íngreme, banhada por cursos d’água e com regime intenso de chuvas. Uma cidade que possui grande quantidade de edifícios pode adaptar estes terraços com vegetação ou mesmo com hortas urbanas compartilhadas. O uso de tecnologias limpas na mobilidade poderá contribuir com a redução do lançamento de partículas poluentes e consequente melhoria da qualidade do ar e da saúde da população. O importante é observar características locais e construir soluções que sintetizem boas práticas de forma adequada”, pondera a arquiteta.

Entrevistados:

Débora Ciociola é arquiteta sênior da Jaime Lerner Arquitetos Associados. Formada em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, mestra em Leisure, Tourism and Environments pela WUR-Holanda e Doutoranda em Gestão Urbana na PUC-Paraná. Integrou a equipe técnica do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba – IPPUC por oito anos. Desde 2010 na JLAA, participa da criação e coordenação de projetos em diversas escalas e localidades, especialmente desenvolvimento e desenho urbano, arquitetura e paisagismo e bairros planejados. É urban sketcher e aquarelista. 

Felipe Guerra é sócio da Jaime Lerner Arquitetos Associados. É arquiteto e urbanista formado pela Universidade Positivo, além de cenógrafo, diretor de arte, carnavalesco e designer de joias. Possui experiência em concepção, desenvolvimento e implementação de projetos em escalas que vão do urbano ao design. 

Contato
Assessoria de imprensa Jaime Lerner Arquitetos Associados – contato@betinicomunicacao.com.br

Jornalista responsável
Marina Pastore
DRT 48378/SP

A opinião dos entrevistados não reflete necessariamente a opinião da Cia. de Cimento Itambé.

18 de janeiro de 2024

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