Concretagem de grandes blocos de fundação tem diversos desafios

A Etringita Tardia e a reação álcali-agregado são alguns dos possíveis problemas nestas situações
26 de outubro de 2023

Concretagem de grandes blocos de fundação tem diversos desafios

Concretagem de grandes blocos de fundação tem diversos desafios 930 475 Cimento Itambé
No Yachthouse Residence Club, foi necessária incorporação de gelo na mistura do concreto, para a redução da temperatura de lançamento.
Crédito: Jorge Luiz Christófolli

A concretagem de grande volume se tornou cada vez mais comum, especialmente em blocos de fundações, trazendo consigo desafios específicos que demandam procedimentos técnicos complexos e uma atenção minuciosa. Para garantir a qualidade e durabilidade da estrutura, é essencial aplicar conceitos avançados de tecnologia do concreto. Durante o 64° Congresso Brasileiro do Concreto, o engenheiro Jorge Luiz Christófolli, gerente de desenvolvimento técnico da Concrebras, falou sobre os desafios e técnicas envolvidos na concretagem de grandes blocos de fundação.

Desafios da Concretagem de Grandes Blocos de Fundação

A concretagem de grandes blocos de fundação é uma tarefa complexa, que envolve diversos desafios técnicos. Christófolli menciona alguns dos principais:

Composição do Concreto: Determinar a composição da dosagem do concreto é fundamental para garantir a qualidade e durabilidade da estrutura de fundação.

Logística da Concretagem: Planejar a logística da concretagem é crucial para garantir que o concreto seja aplicado de forma eficiente.

Logística de Insumos: Além do concreto, é essencial planejar a logística de fornecimento e aplicação dos insumos necessários, como agregados e aditivos.

Monitoramento de Temperatura: Durante a fase de execução, é importante monitorar a temperatura para evitar problemas como a formação de Etringita Tardia (Delayed Etringite Formation – DEF).

“Todas as medidas que foram tomadas na fase de planejamento são essenciais. Sobretudo, elas são importantes para que a obra seja concluída, executada sem nenhum tipo de intercorrência. O planejamento tem que ser muito bem feito para que no momento de execução, não haja nenhum tipo de situação que comprometa a qualidade da estrutura. E este plano tem que abranger todas as possibilidades de falha – estoque de matéria prima, atendimento dos fornecedores, energia elétrica necessária para o funcionamento dos equipamentos, entre outros fatores. Tudo isso deve ser previsto, sempre tendo um plano b ou c em mente”, afirma o engenheiro.

Etringita Tardia (DEF) e Suas Implicações

A formação de Etringita Tardia (DEF) é um fenômeno que pode prejudicar a durabilidade do concreto. De acordo com Christófolli, trata-se de uma manifestação patológica, uma “doença” da estrutura. Descoberta na década de 1980 na Alemanha e Inglaterra, a Etringita Tardia é caracterizada pela expansão da pasta matriz e na região de interface com os agregados. Ela resulta de uma reação química entre íons de sulfato (SO42-) e aluminato tricálcico (C3A), formando o sulfo-aluminato de cálcio hidratado. “São comportamentos que ocorrem em determinadas situações e prejudicam a durabilidade da estrutura. Como já é uma manifestação patológica conhecida, então é preciso tomar as medidas necessárias para que isso não ocorra. Isso pode se dar através da adição de gelo e das sílicas ativas. Trata-se de ações que são tomadas na fase de construção para que a formação da Etringita Tardia não ocorra”, explica o engenheiro. 

O processo de formação da DEF envolve várias etapas, incluindo a formação da Etringita Primária na fase inicial de hidratação, a decomposição da Etringita primária devido a altas temperaturas (>65 ºC) durante o processo de cura, e a adsorção e dessorção dos íons sulfato pelo C-S-H (silicato de cálcio hidratado). A formação da Etringita Tardia pode ocorrer sob determinadas condições, como alta permeabilidade, liberação de íons SO4 pelo C-S-H, e estrutura em contato com água, como em locais com lençol freático próximo.

Análise de Risco e Classes de Exposição

O Laboratório Central de Pontes e Estradas da França (Laboratoire Central des Ponts et Chaussés) faz algumas recomendações baseadas em estudos históricos e também estabelece alguns parâmetros para projeto e execução dessas fundações. Eles definem dois critérios: risco de segurança da estrutura e classe de exposição das estruturas. 

A análise de risco de segurança da estrutura está dividida em três níveis. “A categoria I abrange estruturas onde as fissuras têm baixas ou aceitáveis consequências. A categoria II abrange a maioria das estruturas de concreto, onde a ocorrência de fissuras não afeta e pode contribuir para a deterioração da capacidade de suporte. A categoria III é reservada para situações em que a ocorrência de fissuras é inaceitável, como em contenções de radiação nuclear, túneis e barragens”, expõe o gerente de desenvolvimento técnico da Concrebras.

Além disso, as classes de exposição da estrutura, como XH1, XH2 e XH3, levam em consideração o ambiente (principalmente o solo) em que a estrutura será construída, variando de ambientes secos a úmidos e permanentemente úmidos (em locais onde há lençóis freáticos, por exemplo).

Ao “cruzar” os riscos de segurança da estrutura e classes da exposição das estruturas, obtém-se os níveis de prevenção da formação da Etringita Tardia. Neste contexto, o nível com maior risco é quando há uma construção de categoria III e um ambiente classificado como XH3. “Nestes casos, a temperatura máxima deve ficar abaixo de 65 °C nas condições normais e o limite pode ser definido em 75 °C se houver adição mineral como a ‘sílica ativa, metacaulim’ e a validação da composição for feita por um laboratório especializado em DEF”, comenta Christófolli.

Reação álcali-agregado (RAA)

De acordo com Christófolli, trata-se de um outro desafio da concretagem de grandes blocos de fundação. “São reações químicas que ocorrem ao longo do tempo dentro da estrutura e que provocam a expansão da matriz. Consequentemente, este processo gera fissuras que comprometem a estabilidade e durabilidade da estrutura”, comenta o engenheiro. 

Definição das Características Reológicas do Concreto

A concretagem de grandes blocos de fundação geralmente envolve a aplicação de diferentes camadas de concreto, cada uma com características específicas, por exemplo:

  • 1º – Camada inicial para proteção da armadura de base: concreto fck (1º) CAA (concreto autoadensável) ou Fluido – Refrigerado e Estabilizado
  • 2º – Camada intermediária: Concreto Refrigerado e Estabilizado I – fck (2º)
  • 3º – Camada final: Concreto Refrigerado – fck (2º). 

“Existem duas fases do concreto – a plástica e a endurecida. A primeira delas é a fase plástica, que é quando há a mistura dos elementos – cimento, areia, água e aditivos. Este estado dura cerca de duas a três horas e é quando você consegue aplicar o concreto ou lançá-lo em fôrmas na obra para atingir o formato desejado para fazer pilares, vigas ou outros elementos. Quando ele está suficientemente maleável, permite a passagem pela tubulação das bombas de concreto. Depois de três ou quatro horas, o concreto entra em fase de hidratação, endurecimento e resistência. Para volumes muito grandes, é necessário mais de um dia para a concretagem. No entanto, se no dia seguinte o concreto já estiver endurecido, gera-se uma “junta fria”, uma interface de contato do material antigo com o material novo em estado plástico. Isto é, cria-se uma superfície de transição. Só que isso nem sempre é adequado numa estrutura, pois cria uma região de fragilidade. Para evitar isso, utilizamos aditivos estabilizantes, produtos químicos que neutralizam a hidratação do cimento por determinado tempo. E isso deve ser determinado no planejamento”, defende Christófolli.

Case Yachthouse

Durante a palestra, Christófolli usou o case do edifício residencial de alto luxo Yachthouse Residence Club, localizado em Balneário Camboriú (SC), para ilustrar os desafios da concretagem em grandes blocos de fundação. Com duas torres, o bloco de fundação foi construído em duas etapas totalizando 8.792 m3. Para lançar o concreto nos blocos de fundação das duas torres do empreendimento, foram mais de nove etapas de planejamento – este processo demandou dois meses de pesquisa. “Como a resistência do concreto especificada no projeto era o fck 50,0 MPa, foram elaboradas simulações matemáticas do comportamento térmico da estrutura com diversas combinações de dosagem. Uma das conclusões dos estudos teóricos foi a necessidade do uso da incorporação de gelo na mistura do concreto, para a redução da temperatura de lançamento. Isso acontece, pois, as reações de hidratação do cimento são exotérmicas, ou seja, liberam calor nessa fase. Conforme as dimensões das peças concretadas, o calor gerado poderia atingir valores acima de 65 °C, o que em determinadas condições pode gerar produtos secundários na hidratação, e que comprometem a durabilidade e a vida útil da estrutura. Foram realizados ensaios de dosagem experimental em laboratório, simulações teóricas de modelagem do comportamento térmico da estrutura, ensaios de comportamento reológico de concreto, resistências à compressão aos 7, 28 e 63 dias, módulo de elasticidade, além dos ensaios de caracterização de todos os materiais utilizados”, explica Christófolli.

Entrevistado
Jorge Luiz Christófolli é engenheiro e gerente de desenvolvimento técnico da Concrebras.

Contato
jorge@concrebras.com.br 

Jornalista responsável
Marina Pastore
DRT 48378/SP

26 de outubro de 2023

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