Descobertas históricas em locais onde a construção civil opera têm sido estimuladas por leis federais, através do Iphan
Por: Altair Santos
Publicada há 11 anos, a portaria 230 do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) que obriga construções de médio e grande porte a passarem por avaliações arqueológicas do terreno, tem contribuído enormemente para a descoberta de vestígios culturais no país. Antes da aprovação, em média seis estudos arqueológicos eram autorizadas por ano em canteiros de obras. Hoje, passam de mil. Em 2011, o Iphan autorizou 1.018 intervenções e no ano passado foram 1.431. “Tem sido rigoroso o cumprimento desta portaria, que está embutida na lei de licenças ambientais. Isso aumenta a demanda por pesquisas arqueológicas“, afirma o arqueólogo Sérgio Bruno Almeida, especialista em prospecções em canteiro de obras.

Obras no Porto Maravilha, no Rio, levaram à descoberta do cais do Valongo, que existiu no século 19.
Segundo o especialista, atualmente 80% dos estudos arqueológicos que acontecem em áreas urbanas no Brasil ocorrem em função de descobertas em canteiros de obras. Por isso, há construtoras que passaram a incorporar arqueólogos em seus quadros técnicos, para acelerar processos e impedir que empreendimentos sejam paralisados quando o canteiro de obras já estiver instalado. Normalmente, a pesquisa se dá antes de a empresa adquirir o terreno. “As construtoras que têm um grande volume de obras estão bem atentas a essas investigações. Tudo o que elas não querem é iniciar a obra e depois descobrir que há um sítio arqueológico no local”, explica Sérgio Bruno Almeida, lembrando que essa demanda também tem feito engenheiros civis se especializarem em arqueologia.
Recentemente, os casos mais emblemáticos de revelações arqueológicas em canteiros de obras estão relacionados com o setor público. Na hidrelétrica de Santo Antônio, em Rondônia, ocorreram descobertas de tribos indígenas extintas há séculos. Da mesma forma, na região portuária do Rio de Janeiro obras de revitalização da área trouxeram à tona o cais do Valongo – local onde eram desembarcados os escravos africanos trazidos ao Brasil nos séculos XVIII e XIX. Em outras situações, no entanto, o próprio poder público procura omitir sítios arqueológicos. Em 2010, a prefeitura de São Paulo foi acusada de esconder descobertas em obras do metrô, na região do Largo de Pinheiros. No entanto, o Iphan interveio e fez valer a portaria 230. “Não é sempre que isso ocorre. Na maioria das vezes, um sítio arqueológico se perde entre as obras”, diz Sérgio Bruno Almeida.

Sítio arqueológico na área da hidrelétrica Santo Antônio, em Rondônia: descobertas indígenas seculares.
O arqueólogo lembra que na América do Sul, Bolívia e Peru são os países que têm as legislações mais rigorosas quanto à descoberta de vestígios culturais em canteiros de obras. “O Peru, por exemplo, obriga que as construtoras tenham arqueólogos em seus quadros técnicos. Mas o Brasil não fica tão atrás. Temos uma das legislações mais modernas sobre o assunto. O que falta é maior fiscalização e fazer a portaria 230 abranger também as pequenas obras, a fim de que todas as construtoras se conscientizem sobre o valor das pesquisas arqueológicas“, conclui Sérgio Bruno Almeida.
Entrevistado e currículo
Sérgio Bruno Almeida é arqueólogo, sócio da Fronteiras Arqueologia, empresa goiana que trabalha com pesquisas em sítios em canteiros de obras.
Contato: sergio@fronteirasarqueologia.com.br
Créditos fotos: Divulgação