Coprocessamento de RSU: veja desafios e oportunidades
Indústria cimenteira precisa fiscalizar se o RSU para coprocessamento passou por triagem
O Brasil ainda é um país que conta com altos números de lixões e baixos índices de reciclagem. No entanto, a destinação e tratamento dos resíduos sólidos urbanos (RSU) têm se tornado uma questão relevante no contexto nacional, demandando atenção dos órgãos governamentais e privados. Este foi o tema da palestra “Balizas jurídicas na utilização de resíduos sólidos urbanos (RSU) em processo de coprocessamento em fornos rotativos de cimento”, ministrada no 8º Congresso Brasileiro do Cimento, por Luciano Loubet, promotor de justiça e diretor do Núcleo Ambiental do Ministério Público do Mato Grosso do Sul (MPMS).
“Aqui em Campo Grande, por exemplo, mesmo tendo coleta porta a porta em quase 70% da cidade, aproximadamente R$ 1,6 milhão gastos pela Prefeitura nessa coleta seletiva são enterrados no aterro sanitário todos os meses. Temos apenas 2% de desvio de aterro e 10% de adesão à coleta seletiva. Frente a isso, temos que analisar a potencialidade do coprocessamento em fornos rotativos de cimento, na questão dos resíduos sólidos urbanos”, destaca Loubet.
Enquadramento Legal
A Lei Federal n0. 12.305/2010 delineia os resíduos sólidos urbanos como aqueles provenientes de atividades domésticas, limpeza urbana e pequenos geradores comerciais. Já o coprocessamento em fornos de cimento, regulamentado pela Resolução Conama n0. 499 de 06/10/2020, envolve o processamento de resíduos sólidos como substituto parcial de matéria-prima e/ou de combustível no sistema forno de produção de clínquer, na fabricação de cimento.
Considerações Jurídicas e Responsabilidades
Há premissas cruciais estabelecidas pela legislação, destacando que os resíduos não são lixo, possuindo valor econômico e social, segundo Loubet. Ainda, o promotor destaca que existe uma ordem de prioridade estabelecida na lei para a questão dos resíduos sólidos: não geração, redução, reutilização, reciclagem, aproveitamento energético, tratamento dos resíduos e, por fim, a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos.
Outra questão é que boa parte deste resíduo é de responsabilidade do setor privado, por meio da logística, de acordo com Loubet. “A responsabilidade da logística reversa abrange toda a cadeia produtiva, desde a fabricação até a distribuição e comercialização. Todos os elos desse processo, como fabricantes, envasadores, distribuidores e comerciantes, são encarregados de financiar essa prática. Nesse sentido, acredito que a logística reversa representa um dos pilares fundamentais para promover a sustentabilidade financeira nesse contexto”, sugere.
O promotor enfatiza ainda a inclusão dos catadores de materiais recicláveis nesse processo, com destaque na participação ativa desses agentes na coleta seletiva e logística reversa, conforme estipulado pela Política Nacional de Resíduos Sólidos. “É imprescindível dar prioridade na participação dos catadores e devida remuneração pelo setor privado e público”, afirma Loubet.
Desafios para a indústria cimenteira
Uma situação muito delicada que a indústria do cimento deve levar em conta é a sua eventual responsabilidade civil de fiscalizar se o RSU que está vindo para cogeração realmente está passando por um processo de triagem.
“A utilização de CDR-SU sem essa verificação pode acarretar responsabilidade civil para a indústria cimenteira, pois ela se torna corresponsável por essa fiscalização. Com base em nossa jurisprudência, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabelece que a indústria pode ser responsabilizada por danos ambientais ao permitir, auxiliar, financiar ou de alguma forma contribuir para esses danos. Portanto, é crucial que a indústria cimenteira, em sua abordagem de ESG (Environmental, Social and Corporate Governance – Governança Ambiental, Social e Corporativa), de descarbonização e de colaboração com os catadores, mantenha vigilância constante nesse aspecto da responsabilidade”, pontua Loubet.
Na ótica do promotor, em uma perspectiva de longo prazo para a sociedade, é crucial avançar na redução dos resíduos provenientes das cooperativas, buscando sua reintegração progressiva na cadeia produtiva por meio da reutilização e reciclagem. Quando a reciclagem ou o reuso não se mostram viáveis, o coprocessamento se apresenta como uma alternativa de aproveitamento energético de nível superior em comparação ao simples descarte em aterros sanitários.
Créditos de logística reversa
Para Loubet, é necessário ter muito critério na questão de créditos de logística reversa. “É imprescindível evitar a comparação entre os créditos referentes à reciclagem e aqueles relacionados ao CDR, pois tal prática poderia comprometer a hierarquia estabelecida. Isso poderia resultar na desestimulação da reciclagem e na preferência pela cogeração, levando materiais passíveis de reciclagem a serem direcionados para essa via. Como sociedade, é essencial buscar uma abordagem que utilize os recursos da logística reversa, uma obrigação primordial da indústria, para financiar o CDR, sem prejudicar os catadores de materiais recicláveis ou comprometer o aumento dos índices de sustentabilidade”, justifica.
Fonte:
Luciano Furtado Loubet é promotor de justiça e diretor do Núcleo Ambiental do Ministério Público do Mato Grosso Do Sul (MPMS). Mestre e Doutorando em Direito Ambiental e da Sustentabilidade pela Universidade de Alicante – Espanha (em cotutela com a Universidade Católica Dom Bosco). 2º Vice-presidente da Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente – ABRAMPA. Membro Fundador e Primeiro Coordenador da Rede Latino-Americana de Ministério Público Ambiental. Autor do livro “Licenciamento Ambiental: a Obrigatoriedade da Adoção das Melhores Técnicas Disponíveis (MTD)”. Palestrante em mais de 10 países.
Contato
Assessoria de imprensa 8° Congresso Brasileiro do Cimento – daniela.nogueira@fsb.com.br
Jornalista responsável
Marina Pastore
DRT 48378/SP
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