Brasil precisa de capital humano para se consolidar como polo de negócios

24 de agosto de 2011

Brasil precisa de capital humano para se consolidar como polo de negócios

Brasil precisa de capital humano para se consolidar como polo de negócios 150 150 Cimento Itambé

Relatório mostra que país tem barreiras educacionais a serem superadas, como universalização do ensino médio e o baixo índice de matrículas nas universidades

Por: Altair Santos

Relatório produzido pela Brasil Investimentos e Negócios (BRAiN) avalia que nesta década o país deve se tornar o novo polo de desenvolvimento do mundo. Para isso, precisará produzir talentos e capital humano para justificar a expectativa. Há barreiras a serem superadas, como a universalização do ensino médio e o baixo índice de matrículas no ensino superior. Além disso, é considerado baixo o alinhamento entre o ensino de idiomas e as necessidades do mercado de trabalho, assim como é baixo também o alinhamento da produção acadêmica às necessidades dos setores industrial, de serviços e financeiro.

Paulo Oliveira, diretor-presidente da BRAiN: próximos 30 anos serão decisivos para o Brasil

Para mudar esse quadro, o diretor-presidente da BRAiN, Paulo Oliveira, avalia que o momento para o Brasil reverter essa desvantagem é agora. Atualmente, segundo ele, o país dispõe de uma enorme vantagem competitiva, que é o “bônus demográfico”. Trata-se de um período em que a População Economicamente Ativa (PEA) supera largamente o número de crianças, idosos e dependentes, que ainda não estão no mercado de trabalho. Essa margem de capital humano disponível deve durar por 30 anos, analisa Paulo Oliveira, que na entrevista a seguir relaciona os gargalos que o Brasil precisa superar para se consolidar como um polo de negócios.

Confira:
Para o Brasil se tornar um novo polo de desenvolvimento do mundo ele precisa produzir talentos e capital humano. Quais os gargalos a serem superados para que o país atinja esse objetivo?

Embora nos últimos anos o país tenha evoluído no acesso à educação, especialmente no ensino básico, ainda há desafios de ordem quantitativa e qualitativa. A taxa de matrícula no ensino superior, por exemplo, ainda é inferior à média mundial de 38%, segundo dados da Unesco. Nos 10 países com maiores taxas, o percentual médio é de 79%. No aspecto qualitativo, a questão é ainda mais complexa. Se tomarmos como referência o Programme for International Student Assesment (PISA), uma prova aplicada pela OCDE a estudantes de 15 anos em 65 países, a pontuação dos estudantes brasileiros fica em 54.º lugar, abaixo da de nações como México, Chile, Rússia e China. Outra questão é a do baixo alinhamento do ensino superior com as necessidades do mercado. Esse assunto foi tratado no relatório “Atratividade do Brasil como Polo Internacional de Investimentos e Negócios”, lançado pela BRAiN em junho e disponível no nosso site (www.brainbrasil.org). Em breve, a entidade deverá lançar um relatório específico sobre talentos.

O governo federal tem lançado programas para produzir capital humano, entre eles enviar 100 mil estudantes para complementar os estudos no exterior. Essa é uma boa prática ou precisa mais?
O programa “Ciência para Todos”, que prevê esse tipo de intercâmbio, é uma iniciativa positiva e mostra que o governo percebe a importância da internacionalização na formação profissional. Atualmente, o país envia para intercâmbio um número menor de estudantes que Índia, México e China.  Por isso, na opinião da BRAiN a medida é da maior importância.

Quais os setores da economia que mais carecem de capital humano e talentos, para que o Brasil possa competir com outras nações industrializadas?
O país carece de capital humano em setores de nível superior, especialmente nos ligados à tecnologia. Mas a principal carência é no ensino técnico, na indústria e no setor de serviços, que, por sua vez, emprega a maior parte da mão de obra com formação superior: 25% dos empregados nesse setor têm ensino superior, ante apenas 9% nas outras áreas. Há ainda a questão do ensino de línguas. A percepção do mercado quanto ao alinhamento do ensino de línguas às suas necessidades (demonstrada pelo World Competitiveness Yearbook, do IMD) ainda é baixa, inferior à média mundial. Países como Chile, Índia e Cingapura apresentam resultado melhor que o do Brasil.

Há modelos adotados por outros países que poderiam servir de exemplo para o Brasil formar capital humano?
Cingapura e Coreia do Sul são países que estavam no mesmo patamar do Brasil há 50 anos e hoje estão em níveis equivalentes aos dos Estados Unidos e Reino Unido. Algumas das medidas adotadas envolvem a preparação e valorização dos professores, a busca pelo alinhamento da educação superior com o mercado e a profissionalização na gestão das escolas públicas. Os Emirados Árabes, por exemplo, desenvolveram um projeto de revisão do sistema educacional, mapeando as projeções de crescimento e de setores específicos, bem como da mão de obra qualificada. Esse estudo deu origem a um plano detalhado de investimentos e ações na área da educação, utilizando as melhores práticas de outras nações.

O modelo de ensino brasileiro, sobretudo do ensino médio até as universidades, está preparado para formar cabeças e dar ao Brasil esse volume de talento e capital humano que ele necessita?
Antes de avançar na questão, é preciso ressaltar que o Brasil dispõe de uma enorme vantagem competitiva no mundo para as próximas décadas: o chamado “bônus demográfico”, um período em que a População Economicamente Ativa (PEA) superará largamente o número de crianças, idosos e dependentes, que ainda não estão no mercado de trabalho. Ao mesmo tempo em que é uma vantagem, essa situação gera um desafio do ponto de vista de qualificação dos talentos. Mas hoje já existe um trabalho excelente de qualificação no ensino médio, por meio de entidades como o Sesi, Sesc e Senac.

Um dos desafios da escola brasileira não seria o fato de que ela estimula pouco o empreendedorismo?
O empreendedorismo não é abordado no nível de graduação nas escolas. No entanto, temos bons exemplos de capacitação para o empreendedorismo no Sebrae, por exemplo. Paralelamente, entidades como a BM&F Bovespa vêm realizando um trabalho de estímulo ao empreendedorismo, por meio de parcerias com o Babson College, dos Estados Unidos, uma referência mundial na questão.

Comparativamente com outras décadas, o Brasil tem formado mais ou menos talentos?
Há indicadores que mostram que o processo de formação de talentos vem avançando. Um exemplo: de 1920 e 2010 a taxa de escolarização aumentou de 9% para 86%. Já o índice de alfabetização subiu de 30% para 90% e o número de matrículas nos ensinos fundamental e médio saltou de 1 milhão para 42 milhões. Permitir um maior acesso ao ensino é pressuposto básico para identificar e preparar os talentos.  No já mencionado exame PISA, embora esteja abaixo da média mundial, o Brasil foi, em 2009, o terceiro país com melhor índice de crescimento entre os 65 avaliados. E há iniciativas bastante positivas no aumento da formação de talentos, tanto no âmbito privado quanto no público. Por exemplo, o governo vem trabalhando no estímulo à formação com programas como o PROUNI (Programa Universidade para Todos), que prevê a concessão de bolsas de estudo integrais para cursos de graduação e sequenciais, e o PRONATEC (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego), que tem como objetivo ampliar a oferta de cursos técnicos. No Estado de São Paulo, a Fundação Paula Souza é referência no ensino técnico-profissionalizante. Já o Rio de Janeiro estabeleceu a obrigatoriedade do ensino de inglês e espanhol nas escolas públicas, além de aumentar o tempo de ensino desses idiomas. Na área privada, temos exemplos como o movimento Todos Pela Educação e os trabalhos do Instituto Ayrton Senna e Unibanco e da Fundação Bradesco.

No âmbito da engenharia, o relatório da BRAiN faz alguma ressalva, já que trata-se de uma das áreas que mais têm carência de capital humano?
Sim. O já mencionado relatório “Atratividade do Brasil como Polo Internacional de Investimentos e Negócios” mostra que, numa comparação com 12 países, o Brasil está em último lugar no quesito disponibilidade de engenheiros e gestores de qualidade, fundamental para atrair empresas que queiram se instalar num país. Um exemplo da dificuldade nessa área é o fato de que Petrobrás calcula que, se não forem adotadas medidas para qualificar trabalhadores, a cadeia produtiva de petróleo poderá chegar a 2015 com um déficit de 200 mil profissionais. A maioria desses profissionais está ligada à área de engenharia.

Qual a análise sobre o porquê de o Brasil ter deixado para trás formações tão estratégicas para o país, como a engenharia?

O país passou por diversas crises nas décadas de 1980 e 1990, período em que os investimentos em infraestrutura diminuíram. Esse cenário, por sua vez, gerou uma baixa atratividade nos jovens para carreiras técnicas, por natureza, mais difíceis de serem cursadas. No momento atual, a situação é a inversa, com grande demanda nessas áreas e pouca oferta de profissionais.
Há um prazo para que o Brasil consiga produzir esse capital humano necessário ou seria para ontem?
Analisando a pirâmide etária, em 30 anos o país não contará mais com o bônus demográfico já mencionado. Temos de preparar a atual geração, da qual dependeremos, para que o Brasil tenha um crescimento consistente. Por isso, é preciso intensificar esse trabalho desde já.

Saiba mais
O que é o PISA
O PISA (Programme for International Student Assesment) é um programa internacional de avaliação de alunos, realizado a cada três anos com a finalidade de produzir indicadores sobre a efetividade dos sistemas educacionais. O exame abrange escolas públicas e privadas, avaliando estudantes de 15 anos de idade, matriculados a partir da 7.ª série do ensino fundamental. Além de avaliar o aprendizado de Matemática, Ciências e Leitura, o PISA examina a capacidade dos alunos de analisar, raciocinar e aplicar o conhecimento adquirido em sua vida diária.
Na prova de 2009, participaram do PISA 50 mil estudantes de 990 escolas públicas e particulares das áreas rural e urbana, em 587 municípios. O exame é elaborado pela OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), para oferecer aos países participantes indicadores de comparação internacional, que servem de parâmetro para a melhoria da educação. O Brasil é a única nação da América do Sul que participa do PISA desde a primeira edição, em 2000. A próxima será em 2012.

Outros países que participam do PISA:
Albânia, Austrália, Argentina, Áustria, Chile, República Tcheca, Emirados Árabes Unidos, França, China, Indonésia, Itália, Cazaquistão, Liechtenstein, Letônia, República da Moldávia, Nova Zelândia, Peru, Catar, República da Sérvia, Eslováquia, Suécia, Tailândia, Turquia, Reino Unido, Azerbaijão, Bulgária, Colômbia, Dinamarca, Estônia, Alemanha, Hungria, Irlanda, Japão, Coréia, Lituânia, República de Montenegro, Noruega, Polônia, Romênia, Eslovênia, Suíça, Trinidad Tobago, Estados Unidos, Bélgica, Canadá, Croácia, República Dominicana, Finlândia, Grécia, Islândia, Israel, Jordânia, Quirguistão, Luxemburgo, México, Holanda, Panamá, Portugal, Rússia, Singapura, Espanha, Taiwan, Tunísia e Uruguai.

Entrevistado
Paulo Oliveira, presidente da BRAiN (Brasil Investimentos e Negócios)

Currículo

Engenheiro civil formado pela Universidade Politécnica de São Paulo (Poli-USP). Antes de assumir a presidência da BRAiN, foi diretor de Desenvolvimento de Fomento e Negócios da BM&F Bovespa.
Lançada em março de 2010, a BRAiN (Brasil Investimentos e Negócios) é uma entidade multissetorial de caráter privado que tem como objetivo articular e catalisar a consolidação do Brasil como polo internacional de investimentos e negócios, com foco regional na América Latina, mas com projeção e conexões globais.
A BRAiN conta com 13 associados: ANBIMA, BM&F Bovespa, FEBRABAN, Fecomercio, Banco Bradesco, Banco do Brasil, Banco Santander, Banco Votorantim, BTG Pactual, CETIP, Citibank, HSBC e Itaú-Unibanco.
Contato: contato@brainbrasil.org / dvivan@brainbrasil.org (assessoria de imprensa)

Crédito Foto: Divulgação

Por: Altair Santos
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