A importância da TI para a construção civil
Setor desembarca na Tecnologia da Informação, mas desafio agora é propagá-la para toda a cadeia produtiva
Setor desembarca na Tecnologia da Informação, mas desafio agora é propagá-la para toda a cadeia produtiva
O Brasil começa a descobrir a Tecnologia da Informação (TI) como ferramenta imprescindível para a construção civil. Programas como PAC e Minha Casa, Minha, Vida, e a previsão de grandes obras de infraestrutura por conta de eventos como Copa do Mundo e Olimpíadas, acordaram empreendedores, construtoras e contratantes públicos para o tema. O xis da questão é que a TI, além de agilizar as obras, ajuda a dar qualidade aos projetos e dá mais confiabilidade às decisões.
O problema, alerta o presidente da Associação Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído (Antac), professor Francisco Ferreira Cardoso, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), é que ações governamentais precisam fomentar mais o setor a investir em tecnologia, desenvolvimento, pesquisa e inovação. É disto que ele trata na entrevista a seguir. Confira:
O que falta para que a Tecnologia da Informação (TI) seja totalmente incorporada pelo setor da construção civil?
Muitos avanços ocorreram nos últimos anos nessa área, mas falta ainda uma disseminação das conquistas. A grande maioria das empresas do setor é formada por micro ou pequenas empresas, sejam elas projetistas, construtoras ou subempreiteiras que executam serviços específicos nas obras – isso citando apenas alguns dos agentes setoriais. Elas têm computadores e os utilizam em partes de suas atividades, mas de forma isolada. A grande maioria não tem um sistema gerencial, quanto mais pensar numa integração gerencial. Muito poucas se comunicam com clientes e fornecedores via TI. Faltam-lhes gestão, faltam-lhes capacitação, faltam-lhes diversos recursos. As tecnologias existem, mas ainda não foram incorporadas pelas empresas por esse Brasil afora.
No que o uso da TI ajuda na aceleração de processos construtivos e no barateamento das obras?
Ajuda, pois permite o uso de ferramentas que ajudam a alcançar os objetivos traçados. Mas somente TI não resolve. A empresa tem que ter gestão, tem que dominar as tecnologias construtivas. É preciso integração com sua cadeia de suprimentos.
O senhor avalia que, no Brasil, falta também Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) nas áreas relacionadas ao ambiente construído, como habitação, materiais, processos construtivos e saneamento?
Mais uma vez aqui muitos avanços ocorreram. Várias empresas têm investido, principalmente a indústria de materiais de construção, mas é preciso que os outros agentes da cadeia construtiva acompanhem esse avanço. As construtoras, por exemplo, investem muito pensando no curto prazo, mas ainda investem muito pouco ou quase nada em pesquisa e desenvolvimento. Falta muita pesquisa e a maioria dos agentes do setor nem se dá conta disso.
Quais as ações governamentais que precisam ser implementadas para que tecnologia e pesquisa ganhem espaço na construção civil brasileira?
Estive recentemente no Construbusiness e, neste ano, dois ministros falaram – o da Indústria e Comércio Exterior e o dos Esportes -, assim como o presidente do Banco Central e as lideranças empresarias do setor. Porém, nenhum fez qualquer referência ao desenvolvimento tecnológico e à necessidade de investimentos em P&D na construção civil. Penso que acham que o setor é diferente dos outros, como o automobilístico, o eletrônico, o de telecomunicações, o de energia. Para estes, certamente acham que governos e empresas devem investir firme em P&D. Já na construção, ora a construção, pensam que é bom fazermos com sempre fizemos, ou seja, acham que as inovações vêm da prática, do empirismo. Não percebem que precisa haver investimento em P&D, assim como uma política de Ciência, Tecnologia e Inovação (C,T&I) para o setor.
Por que isso ocorre?
O que acontece é que os recursos não são destinados ao setor da construção civil na devida medida da sua importância econômica e social. Até porque, como não há uma política setorial de C,T&I, e os agentes do setor não percebem a importância dos investimentos em P&D, não há demanda e muito menos pressão por recursos. Já os outros setores, muito mais avançados na percepção da importância desse tema, conseguem uma parcela muito maior do dinheiro do que sua importância social e econômica lhes destinaria. Eles têm razão em brigar por recursos. Nós é que estamos errados.
No que programas de infraestrutura e habitacionais, estimulados pelo governo, podem ajudar a reverter esse quadro?
Já estão ajudando. Por exemplo, o Ministério das Cidades, com a nova versão do PBQP-H (Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade de Habitat), percebeu que não pode trabalhar sozinho. O programa Minha Casa, Minha Vida tem todos os seus projetos vinculados ao PBQP-H. Isso significa o uso obrigatório de produtos, conforme as normas e aos seus programas setoriais da qualidade, assim como a contratação de construtoras com sistema de gestão de qualidade certificado. Ele cobra também o uso de tecnologias inovadoras, que tenham obrigatoriamente seu desempenho atestado, com destaque para a durabilidade.
Quais os planos da ANTAC para reverter esse cenário?
Estabelecer, junto com os agentes públicos e privados do setor, uma política de Ciência, Tecnologia e Inovação para o ambiente construído. Com ela, poderemos todos fazer planos, estabelecer metas, conseguir recursos e alinhar iniciativas. Também é preciso ofertar pesquisa – via universidades e institutos de pesquisa – e estimular a demanda, para que os avanços e as inovações se alinhem com mais facilidade ao setor da construção civil.
Falando de sistemas construtivos, tem-se hoje no país muitas alternativas, como formas, pré-fabricados, etc. Neste quesito, o Brasil evoluiu ou ainda deixa a desejar em relação a outros países?
Estamos refazendo o que fizemos nos anos 1970 e 1980. A tecnologia daquela época foi perdida, até porque também na ocasião não houve desenvolvimento tecnológico, apenas cópia. Hoje não mudou muito. Quem tem uma solução completa, estudada, que garanta não somente custo, mas desempenho, durabilidade, ausência de manifestações patológicas? Poucos. Cada um trabalha do seu lado, mas pouco se pensa sistemicamente. Aconteceram evoluções, muitas das quais promovidas pela indústria de materiais, mas que ainda não se tornaram uma solução definitiva na obra. Uma evolução importante foi a introdução do conceito de desempenho, mas que ainda é desconhecido da maioria, quanto mais praticado. O outro é o da sustentabilidade, principalmente da sua dimensão ambiental, mas para ele a realidade também é a mesma, ou seja, poucos praticam.
No que o quesito qualificação profissional pesa neste arcabouço todo que o senhor colocou?
Acho que não só o quesito capacitação profissional, mas também o capacitação empresarial. Principalmente dos microempresários. Quem produz de fato nos canteiros de obras, sejam eles das construtoras, sejam de obras construídas pelo regime de autogestão, são as empresas executoras de serviços de obras. Essas são tão ou mais desamparadas do que os trabalhadores do setor. Faltam-lhes recursos e competências, incluindo tecnologia, organização e gestão. São várias dezenas de empresas que precisam ser capacitadas, precisam de recursos, principalmente crédito e, mais ainda, precisam ser contratadas pelo valor justo – seus diferenciais precisam ser reconhecidos e o valor que agregam remunerados. Quase nunca é assim, e acabam sendo contratadas pelo preço mínimo, concorrendo com empresas ilegais. Nenhuma tecnologia vai funcionar sendo executada por empresas sem recursos e competências que sejam reconhecidos e incentivados pelos contratantes.
Qual o papel das escolas nesse processo de transformação?
Escolas, em todos os níveis, formam os cidadãos e os profissionais do setor – do ensino fundamental ao superior e à pós-graduação, passando pelo ensino profissional de trabalhadores da produção, por exemplo. Sem a escola fica faltando um ativo essencial ao setor e ao país: mão-de-obra capacitada em todos os níveis. Inclusive engenheiros e arquitetos.
Entrevistado:
Francisco Cardoso, presidente da Associação Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído (Antac): francisco.cardoso@poli.usp.br
Texto complementar
Sebrae discute projeto para estimular TI
Pequenas empresas terão recursos para investir em projetos de Tecnologia da Informação
O Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae Nacional) está discutindo um projeto novo que prevê o financiamento de micro e pequenas empresas de tecnologia da informação (TI). O setor está conseguindo recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para inclusão digital de pequenas empresas, disse o diretor técnico da entidade, Luiz Carlos Barboza.
Segundo ele, a linha de crédito vai financiar a aquisição de equipamentos e programas de gestão. Hoje, as pequenas empresas compram o computador, têm acesso à internet, mas não utilizam o potencial da inteligência”, afirmou . “Ficam usando como correio eletrônico, para acessar a conta do banco. Não passa muito disso.
As pequenas empresas que tomarem os recursos terão consultoria do Sebrae e da Federação Nacional das Empresas de Serviços Técnicos de Informática e Similares (Fenainfo). Numa primeira fase, em 2010, cerca de 20 mil micro e pequenas empresas deverão ter acesso a esse financiamento.
O Sebrae Nacional já desenvolve parcerias com várias entidades para inclusão de pequenas empresas, como o Programa de Estímulo ao Uso de Tecnologia da Informação em Micro e Pequenas Empresas (Proimpe). Um exemplo é o setor de confecções, onde são desenvolvidos programas de computador para o setor.
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